terça-feira, 3 de junho de 2008

o mapa do tesouro

Li em alguma revista que, enquanto os adultos que vivem ao relento geralmente não têm nada além da roupa do corpo, os meninos de rua são muito ciosos de suas posses. Pode ser um brinquedo velho, um tênis que não serve mais, um toco de lápis, um maço de cigarros... Eles procuram frestas e buracos no concreto e escondem todas essas preciosidades lá no fundo, livres de olhares cobiçosos. De quando em quando, voltam ao esconderijo, conferem se tudo está nos conformes, adicionam mais um ou outro bem encontrado por aí. Certo dia, colocam tudo num saco e carregam sua fortuna para outro lugar, pois aprenderam nas ruas que o movimento constante é uma prerrogativa da sobrevivência.
E eu, que pela janela do ônibus observo um mendigo de quem a vida tirou até os dentes, me pergunto em que momento exatamente aquele ex-menino esqueceu o caminho até o seu tesouro. Ou, simplesmente, abriu mão de tudo.
Sim, esse é o momento definitivo de uma vida.
Depois, restam esses dias acinzentados pela saudade ninguém sabe de quê e dedicados a uma busca sem fim.
Em cada fresta, em cada buraco da cidade, o túmulo de um sonho. E eu me pergunto, sem grandes esperanças, onde foi mesmo que eu enterrei o meu.

12 comentários:

Agatha disse...

Se eu for pensar nisso agora acho que fico triste por dias e dias.
Lindo o texto!

Anônimo disse...

Engraçado, eu tenho uma idéia de texto que dialoga com esse seu :)

Lindo, querida, lindo...

Anônimo disse...

Ei! A gente sempre lê, sempre.

É como o elefantinho, as chaves e os ímãs. Já fazem parte da rotina, mesmo quando estão longe.

Simone Iwasso disse...

ai, ilis, ler sua sensibilidade me dá saudades de vc, ser humano especial!

Ilis disse...

Menina Agatha, nada de ficar triste... A intenção não era essa.
:)
Cacau, devido à "técnica do elefantinho" (também conhecida como lavagem cerebral), estou com o celular ligado há dois dias.
Si, saudades muitas de ti. Vamos mesmo nos ver neste sabadão?
:)
beijo

Anônimo disse...

Infelizmente, os adultos que vemos na rua normalmente não são as crianças de ontem. Essas dificilmente chegam a crescer. Os mendigos grandes costumam ser gente que perdeu tudo, ou enlouqueceu, ou fugiu... é por isso que têm desprendimento, ao passo que as crianças têm algum orgulho...

Ilis disse...

diego, concordo totalmente com você que as crianças que vemos hoje nas ruas dificilmente chegam a crescer.
mas sim, os adultos que vemos na rua são as crianças de ontem _não que tenham sido crianças de rua. mas seguramente foram crianças.

pobres ou ricas, pretas ou brancas, passaram por essa fase com o orgulho inato e algum tesouro. que, como todos nós, foi deixado para trás.

mas acho que já estou soando peter pan demais... sorry.
bjs

Ilis disse...

ops, o "como todos nós, foi deixado para trás" tá meio estranho, mas acho que dá para entender...

Luiz Gómez disse...

Opa...

tomei a liberdade de reproduzir o texto e indicar o Scriptease em meu blog www.blogdogomez.blogspot.com

Muito bom!!!

Ilis disse...

Obrigada! Tanto pela visita como pelo comentário.
:)
Vou lá dar uma olhada.

Rackel disse...

Nossa.. quanto tempo q eu não venho nesse blog! Amei esse post. Eu mesma, sinceramente, não sei onde enterrei os meus sonhos e as vezes até duvido q eles um dia existiram...

bjs

Gustavo Arimatea disse...

Esse é um texto que eu deveria ler em qualquer dia, menos hoje.
De qualquer forma, é maravilhoso. Parabéns!