sexta-feira, 23 de março de 2007

On the road...


Olha, Ângelo... _Ele sentado no muro da rua, os pés descalços balançando a meio palmo do chão, o rosto afogueado. Eu ia dizer para ele ir embora, mas descobri no meio da frase que não tinha esse direito. Lá dentro, a família toda tentando controlar o tio, que havia bebido demais. De novo.
Sentei ao seu lado e ficamos olhando para a porta fechada, para a janela fechada da casa. O vento da rua batia em nossa nuca, prometendo dias de liberdade. Às vezes eu queria fugir, eu disse, querendo dizer por ele, na verdade.
Eu não, respondeu ele.
Então eu pensei que fugir seria bom sim, por mim mesma. Mas não sem ele. Num carro conversível, a tarde caindo, ouvindo o rádio. Para onde poderíamos ir?
Ângelo, o que você acha que vai acontecer? _como se os dois anos que o tornavam mais velho fossem suficientes para que ele tivesse todas as respostas que eu não tinha.
"E eu lá sei de alguma coisa?"
"Mas você também nunca sabe nada!" _eu sei que não devia, mas estava com raiva dele também. "Você podia fazer alguma coisa, mas não faz nada. Nunca sabe nada. Fica aí parado, feito mosca morta. Não quer fugir, não reage. Não se defende. Você é um covarde. Por isso é que o seu pai veve batendo em você!"
Ele riu. "Veve?" E me olhou com um certo desprezo simpático. "Analfabeta..."
Não me contive e bati nele também. No mesmo lugar. O rosto do menino afogueado, mas agora também os olhos, úmidos, ardiam. Ainda assim, não moveu um músculo. Não disse nada.
Fui eu que fugi, humilhada e sem rumo, para longe dali.

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